sexta-feira, 29 de abril de 2005

Continuação - CAPÍTULO 1

Vi mais uma vez o nascimento do nosso primeiro filho, Paulo. Lembrei-me que nesse mesmo dia dei à Cristina uma corrente de ouro com um pingente em forma de trevo de quatro folhas, desde esse dia ela nunca mais o tiraria. Senti de novo a mesma alegria que tinha sentido há 16 anos ao ouvir o choro do meu filho, o homem que daria continuidade ao meu império pessoal. Das primeiras noites de insônia, das preocupações com doenças comuns em qualquer criança, mas que para mim muitas vezes eram o sinal de que eu não tinha gerado uma criança perfeita.

Continuamos juntos mesmo quando Cristina sofreu, anos depois, com uma séria depressão causada por uma decepção profissional agravada, em parte, por minhas cobranças e insatisfações pessoais. Assistimos nosso casamento se tornar um inferno, com brigas diárias, a maioria iniciada em alguma conversa sobre bens materiais. Logo me lembrei de um episódio em específico. Anos depois eu ainda me culparia por tudo aquilo.

- É isso que todos os nossos ‘amigos’ estão fazendo! Precisamos nos mudar para uma casa maior, em um bairro melhor, tenho certeza de que com isso ficaremos mais perto da minha promoção! É assim que o mundo funciona! – eu gritava, com um sentimento de ódio e decepção me sufocando.

- Mas nós acabamos de nos mudar – ela disse com lágrimas nos olhos, a cabeça baixa e a mão esquerda acariciando a barriga.

Dessa vez não ouvi choro nenhum. Após uma gravidez conturbada e uma complicação durante seu parto, Clara nasceu prematura, com apenas seis meses e pouco mais de 700g. Seus primeiros cinco meses de vida fora do útero materno foram dentro de uma estufa de vidro, respirando e se alimentando com a ajuda de aparelhos. Ela venceu todas as batalhas desde o primeiro segundo de vida.

Meses depois, pouco antes do nascimento de Clara, compramos nossa primeira casa, em um bairro pacato de classe média. Vivemos lá até Clara completar dois anos.

Olho novamente para o Sr. Albert, já recuperado do pequeno acidente, com as mãos sobre a mesa e os dedos entrelaçados, me olhando como se esperasse por alguma reação. Imediatamente pensei na minha primeira entrevista com o Sr. Albert, na época apenas um gerente de departamento, mas não restavam dúvidas de que um dia aquele homem, na época com bem menos peso e muito mais cabelo, viria a se tornar num futuro não muito distante o homem mais importante da empresa. Como em todas as ocasiões que eu vim a presenciar, ele conduziu a entrevista com a mesma aspereza de sempre, talvez uma característica desenvolvida por pessoas que colocam o dinheiro como a grande prioridade de suas vidas.

Aquele momento era tudo o que eu esperava há anos, mas agora, mesmo que por uma fração de segundos, tudo me parecia indiferente, sem propósito. Seria mesmo necessário trocar nossas vidas, já tão resolvidas e seguras depois de tantas conturbações e problemas, por um destino desconhecido? Precisaríamos abandonar nossas famílias para morar num lugar estranho, frio e distante, apenas pela ânsia do status de um cargo de confiança e um salário ainda mais alto? Precisaria mesmo começar tudo do zero para ter a sensação de alcançar novamente o sucesso?

Respirei fundo e soltei a resposta, como se aquilo não tivesse nenhum impacto na minha vida, como se eu estivesse aceitando um chopp gelado numa tarde de verão.

- Sim, claro. – disse olhando nos olhos do Sr. Albert, completando com vinho sua taça e depois a minha - Foi para isso que eu dediquei os últimos 17 anos da minha vida, não foi? Ao Projeto Finlândia! - ergui minha taça, dei um pequeno gole e depois a coloquei sobre a mesa enquanto pensava em como seria a minha nova vida...

Continua...

domingo, 24 de abril de 2005

CAPÍTULO 1 - ESCOLHAS

Quase três meses nos separavam daquele dia no Aeroporto. Em uma noite quente de Fevereiro, durante um jantar de negócios num dos restaurantes mais caros da cidade, recebi um convite para chefiar a implantação da primeira filial internacional da TeckPack, uma fábrica de embalagens para produtos alimentícios fundada por Hans Steiner nos anos 60. Foi o próprio Sr. Albert, presidente e todo poderoso da TechPack Embalagens Especiais Ltda, neto do velho Steiner, quem me fez a proposta.

- É o lugar mais aconchegante do mundo! – dizia com orgulho, ao contar com um ânimo de quem está realizando um sonho, sobre suas visitas para a concretização do negócio.

Durante os últimos 10 anos a empresa viu o mercado nacional se tornar pequeno para sua capacidade de produção, expectativa e potencial de crescimento. Com uma grande capacidade para os negócios Sr. Albert, um sujeito baixinho e carrancudo que mancava de uma perna, talvez pela idade já avançada, levou a empresa da família a um crescimento e lucratividade que nem o próprio velho Steiner poderia imaginar.

Acomodados em uma das melhores mesas do restaurante e após algumas taças do vinho mais caro Sr. Albert fez a proposta, sem rodeios, como ele costuma fazer com todos os assuntos ligados ao seu negócio.

- Jorge, meu filho - disse ajeitando os óculos sobre o nariz - Hoje é o seu dia! Encha seu copo e vamos ao que interessa. – sua voz rouca e grave me atingiu como um trovão – Você já sabe do que estou falando, não? - disse enquanto erguia as sobrancelhas e colocava o guardanapo no colo – Você será o número um da TechPack na Finlândia! Parabéns, meu garoto! – completou Sr. Albert com uma gargalhada alta, seguida de uma tosse forte e gorda.

Minha vida toda passou como um filme diante de meus olhos enquanto eu observava aquele senhor de 73 anos que, com o rosto vermelho e a jugular pulsando forte, quase morria engasgado na minha frente.

Quando me dei conta eu estava revivendo meus primeiros dias na faculdade, observando a garota mais linda que eu já tinha visto se sentar ao meu lado, seu cabelo preso no alto da cabeça revelava uma pequena tatuagem na nuca, um trevo de quatro folhas. Eu adorava garotas com tatuagens, elas me faziam sentir rebelde e era isso o que eu procurava na época. No mesmo dia descobri seu nome, Cristina.

Nunca mais nos separamos.

Continua...

terça-feira, 19 de abril de 2005

Prefácio

Com alguma dificuldade deixei de lado um casaco de lã, comprado especialmente para a viagem, e minha valise de couro, contendo uns poucos documentos pessoais, para apanhar minhas malas no bagageiro do táxi. Enquanto coloco-as no chão, minha esposa e filhos - um garoto de 16 anos e uma garota de 14 - fazem o mesmo. Como era de costume, arrumamos tudo em dois carrinhos, um com as bagagens dos homens e outro com a bagagem das ‘garotas’. Parecia mais uma de nossas viagens de férias se não fosse pelo destino que nos foi reservado.

O dia estava seco e cinzento, um vento frio cortava toda a cidade enquanto nos dirigíamos ao Aeroporto Internacional. Dentro do carro, com a temperatura controlada, nos sentíamos unidos mais uma vez, prontos para o começo de uma nova aventura, uma nova vida. Todos os problemas que ainda nos assombravam sumiriam, como uma paisagem de inverno que dá lugar às primeiras flores da primavera.

Agora, dois anos depois daquele dia e após muitas descobertas, tenho certeza de que não estávamos nem um pouco preparados para o que nos esperava.

segunda-feira, 18 de abril de 2005

A VIAGEM DE UMA VIDA!

Aguardem...