por Roberto Quiroga Mosquera
SÃO PAULO - Nesta semana gostaria de tratar da temática dos "valores" no Direito. Ou seja: pretendo analisar a questão atinente ao conteúdo axiológico (valores) das normas jurídicas. Isso porque, se o Direito é um bem criado pelo homem, toda e qualquer regra de Direito está impregnada de "algum valor". Tais valores são, conscientemente ou inconscientemente, "depositados" pelos homens nos comandos normativos ao criá-los. No dizer do maior filósofo do Direito brasileiro, Miguel Reale: "de todos os seres, só o homem é capaz de valores".
Mas afinal de contas, o que são "valores"? Mais especificamente, o que são os valores "no' e "para" o Direito? Tomemos um exemplo para tentar aproximá-los do citado conceito.
Em 1961, quando era presidente do Brasil, o sr. Jânio Quadros baixou uma regra que dizia expressamente: "É proibido usar biquíni". Imagine você - mulher - deparando-se com uma regra dessa espécie. Imagine como seria sua reação ao entrar na praia de Ipanema e se confrontar com uma placa fixada na areia que dissesse: "É proibido usar biquíni". Como você se comportaria? Como você se vestiria? Esqueça que você está em 2004. Esqueça que existe, nos dias atuais, o "fio dental". Pense que você está em 1961. Procure "transportar" sua mente e seu corpo para a década de 60. Como você iria à praia de Ipanema em 1961?
Por outro lado, imagine-se você - mulher - numa situação diametralmente oposta. Imagine qual seria sua reação ao entrar numa praia de nudismo e se confrontar com uma placa fixada na areia que dissesse: "É proibido usar biquíni". Como você se comportaria nessa situação? Sua vestimenta seria idêntica à da hipótese acima? Lembre-se de que estamos falando de uma praia de nudismo nos dias atuais (2004). Procure também "transportar" sua mente e seu corpo para a mencionada situação. Como você iria à praia de nudismo em 2004?
Caro leitor: que interessante o exemplo, não? Veja: uma norma com a mesma estrutura lingüística; porém, com dois comandos normativos absolutamente distintos.
Não há dúvida! Na primeira hipótese, suponho que você - mulher - iria à praia de Ipanema vestida com maiô; roupa de praia mais recatada, mais conservadora. Isso porque, em 1961, se pretendia evitar o comparecimento às praias brasileiras com vestimentas impróprias para a época (pelo menos no entender do então presidente). Aparentemente, os "valores" amparados pela norma eram os bons costumes, a família, a moral. Quando o legislador da época criou o referido comando legal, os "valores em jogo" da sociedade brasileira eram diferentes dos atuais.
Já na praia de nudismo, não hesito em dizer que você - mulher - iria nua. Ora, a praia de que estamos falando é de nudismo! Qualquer vestimenta é imprópria para o local. Mesmo um minúsculo biquíni iria constranger os demais amantes do "naturalismo" (sic). A prática do nudismo revela a preservação de um valor desejado pela respectiva comunidade. Na referida praia, todos devem comparecer nus! Os "valores em jogo", agora, são outros. Os costumes, a moral e a família, nesse caso, são vistos sob outro prima. O que se quer proteger é a liberdade!
Em síntese: é verdadeiro dizer que todas as normas jurídicas, sejam elas de que natureza forem, estão impregnadas de valores _valores "humanos" (desculpem o pleonasmo). Por menor que seja a identificação do conteúdo axiológico das normas jurídicas, não nos esqueçamos que as leis são feitas "pelos" homens e "para" os homens.
Quinta-feira, 27 de maio de 2004
Matéria publicada no site jurídico Última Instância.
quinta-feira, 1 de fevereiro de 2007
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário