quinta-feira, 10 de fevereiro de 2005

Parte VI - A canga é uma questão de higiene

Matéria realizada pelo repórter Pedro Dória, do site no mínimo.


A canga é uma questão de higiene

Não foi apenas a televisão portuguesa que exibiu a Colina. Há pouco mais de cinco anos, o “SBT Repórter” fez um especial sobre a colônia e suas imagens, no dia seguinte, foram aproveitadas no “Programa do Ratinho”, que se largou a ridicularizar as pessoas. Rendeu processo, havia uma permissão de uso de imagem específica para o programa de reportagens, e também uma grande desconfiança por parte dos moradores com jornalistas.

Uma das pessoas que assistiram ao programa era Raul de Oliveira, na época dono de uma padaria em Igrejinha, uns 30 quilômetros longe, no caminho para Gramado. Raul é o gaúcho arquetípico, com bigode espesso e cuia de chimarrão sempre próxima. Em 1999, vivia tenso, com revólver na cintura, dado o número de assaltos ao comércio local – jamais precisou da arma, mas o estresse era suficiente para que perdesse o sono, tentando captar qualquer ruído estranho no lado de fora. Beth, sua mulher, tinha se aposentado como professora do estado fazia pouco tempo.

A idéia de visitar a Colina foi dela. Um dia, vieram, entraram, nunca mais saíram. Ele vendeu a padaria em Igrejinha, comprou de Marcelito a concessão do mercado, ampliou o espaço, variou a quantidade de produtos. Os primeiros dois anos foram difíceis até conquistar freguesia e convencer os moradores de que não era preciso descer a Taquara para comprar o que precisavam. Hoje, quando sai às compras, liga para cada cabana e pergunta se querem algo de especial. Suas duas filhas adultas moram nas redondezas e até se despem quando visitam, mas tocam suas vidas à distância.

Outra que assistiu ao programa, também nas proximidades, era Verônica Domingos, então com 20 anos, operária da indústria de calçados, casada. Seu pai morava em Morro do Céu, o que lhe chamou a atenção para a história. Ao ver Etacir na tevê, com cabelos compridos, atiçou o marido: "Ainda vou conhecer este cabeludo." Ele retrucou: "Então vai." Mas ela não foi. Com o passar do tempo, separaram-se, Verônica pediu acolhida ao pai e soube que havia um time de futebol feminino por ali. Conheceu Eta como técnico e, quando ele a convidou depois de um tempo para conhecer a Colina, ela respondeu: "Achei que nunca ia convidar." Em janeiro de 2003, juntaram-se e ela foi morar na comunidade. A essas alturas, Eta era veterano de 8 anos na Colina. Juntos, os dois tocam a lojinha de souvenirs e exploram a logomarca do lugar, vendendo camisetas, chaveiros, o que for. E muitas cangas – todos andam com canga pendurada no pescoço, homens e mulheres, por uma questão de higiene, para proteger na hora de sentar.

Próxima parte - Prefeito inglês

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